Medidas Antidumping e o Crescimento da Indústria Doméstica

Publicado em: 28/07/2012

 

Gabriela Tiussi

Diferentemente do que aconteceu durante a Grande Depressão na década de 1930, período no qual foram tomadas medidas protecionistas extremas, atualmente os países enfrentam a crise econômica se utilizando, sim, das referidas medidas, porém com o comércio internacional disciplinado por normas multilaterais, bem como com o exemplo do precedente e a consciência de que mais importante do que proteger o mercado interno, é estimulá-lo.

Em período anterior à crise que se iniciou no segundo semestre de 2008, havia movimento contínuo em direção à abertura de mercados. Em decorrência da crise e da insegurança com relação à manutenção da indústria nacional, houve o aumento das investigações e aplicações de medidas antidumping, espécie de defesa comercial por meio da qual o governo enxerga a garantia contra a concorrência desleal, através do controle das importações sobre determinados produtos quando são vendidos para o Brasil por preço inferior àquele praticado no mercado do país exportador.[1] Para que seja concedido o direito antidumping devem ser considerados três fatores: existência do dumping, existência do dano à indústria doméstica e; nexo causal entre o dumping e o dano.

Na Rodada do Uruguai, em abril de 1994, foi assinado o Acordo de Implementação do artigo VI do GATT 1994, que regulamenta as regras para aplicação de medidas antidumping. Atualmente, o Brasil possui 90 medidas antidumping em vigor e outras 56 investigações em curso, batendo recorde em protecionismo, segundo a ONU.[2]

Diante da crise mundial e do amplo crescimento da indústria nacional, entendeu o governo pela necessidade de proteção e incentivo à indústria nacional. Destaca-se do Plano Brasil Maior a meta de “sair da crise internacional em melhor posição do que entrou”. De fato, os países chamados emergentes sofreram menos impactos com a crise e foram além. Os BRIC, liderados pelo crescimento da China, têm expandido desde a crise. O Brasil, em particular, por depender muito mais do seu mercado interno do que de investimentos internacionais.[3]

Ocorre que, como consequência do crescimento econômico do Brasil, há a maior visibilidade por parte daqueles que criaram relação de dependência comercial com países que não mais têm recursos para mantê-la, fazendo com que o país seja alvo do “escoamento” dos estoques de produtos destinados à exportação, o que pode prejudicar a indústria nacional.

De fato, percebemos que apesar do Brasil figurar entre os países que mais iniciam investigações antidumping, o faz com objetividade, clareza e obedecendo a finalidade real da medida. É necessário, como vem ocorrendo, que todas as partes envolvidas na investigação tenham a oportunidade de intervir e se defender durante o processo.

Pela Resolução CAMEX 50, de 05 de Julho de 2012, tornou-se pública a criação do Grupo Técnico de Avaliação de Interesse Público – GTIP, assim como do roteiro para pedidos de suspensão ou alteração de medias antidumping e compensatórias definitivas, bem como a não aplicação de medidas antidumping e compensatórias provisórias, por razões de interesse público.

Já era imprescindível o acompanhamento das investigações de dumping por parte das empresas importadoras, visto que a Câmara de Comércio exterior - Camex aprovou a aplicação de antidumping retroativo, objetivando evitar a formação de estoque pelas empresas meses antes da aplicação da medida. Com a resolução CAMEX nº 50, as empresas nacionais poderão também se manifestar contra a aplicação de medidas que afetarão sua produção.

Se a principal crítica com relação ao uso dos direitos antidumping se relaciona ao entendimento de que a medida é inibidora da livre competição, deve ser observado que o artigo 64, parágrafo 3º do Decreto 1.602/95, que regulamenta a aplicação de medidas antidumping, dispõe que mesmo havendo a comprovação do dumping e o dano dele decorrente, as autoridades poderão decidir, por razões de interesse nacional, pela suspensão da aplicação do direito.

O conceito de interesse nacional já existe em legislações antidumping da União Europeia e Canadá, por exemplo, porém seu uso não é frequente. No Brasil, com a criação do GTIP busca-se análise eficaz dos reflexos da aplicação das medidas antidumping em todos os setores da indústria nacional afetados, que poderão pleitear pela suspensão, alteração ou não aplicação das medidas antidumping e compensatória, através de formulário publicado anexo à resolução nº 50.

Desta forma, destaca-se novamente a necessidade de acompanhamento pelas indústrias importadoras e produtoras que dependam da importação das possíveis investigações sobre seus produtos ou até sobre outros produtos que tenham impacto na sua indústria, visando à manutenção dos seus direitos, bem como evitando prejuízo e a aplicação abusiva das medidas.

Verifica-se que a preocupação do governo vai além da utilização dos mecanismos de defesa comercial quando busca, da mesma forma, a participação da indústria nacional que terá a cadeia produtiva atingida pela aplicação de alguma medida e pode pleitear sua não aplicação. Assim, estimula-se a competitividade e crescimento autônomo do mercado nacional.

Deste modo, através da participação de todas as partes possivelmente atingidas com a aplicação das medidas antidumping, pode se chegar ao equilíbrio entre o incentivo e proteção dos mercados nacionais e a liberação comercial internacional, fazendo com que os mecanismos de proteção comercial continuem mantendo sua função real, que é o enfrentamento de problemas pontuais de importação, enquanto o estímulo ao mercado interno, ainda que favoreça também as importações, favorece principalmente a economia a longo prazo.

 

 



[1] O dumping é verificado quando há exportação de determinado produto por um país a preço inferior do praticado por este em seu mercado interno.

[2]O referido levantamento foi realizado pela ONU, OMC e OCDE e foi considerado equivocado pelo governo brasileiro.  http://economia.estadao.com.br/noticias/economia,brasil-bate-recorde-em-protecionismo-diz-onu,114594,0.htm

[3] Para maiores informações sobre a reação à crise pelos países em desenvolvimento acessar: http://ictsd.org/i/news/pontes/119522/

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