Aplicação de estímulos fiscais em caso de descompasso das NCM

Publicado em: 28/07/2010

Ewerton Moreno



Visando ao fomento econômico e ao desenvolvimento do país atribuiu-se à União, Estados, Distrito Federal e Municípios competência para a concessão de incentivos e benefícios fiscais que representem vantagens ao contribuinte no cumprimento de obrigações principais e acessórias.


Neste sentido, a Constituição Federal pátria em seu artigo 155, § 2º, XII, "g" prevê que cumpre à lei complementar "regular a forma como, mediante deliberação dos Estados e do Distrito Federal, isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados".


A fim de individualizar os produtos estimulados, as normas, muitas vezes, discriminam pelos códigos da NCM e também pela descrição os mesmos. Entretanto, rotineiramente nos deparamos com situações nas quais a norma que estabelece o benefício ou incentivo traz código NCM desatualizado ou até mesmo usa uma classificação fiscal equivocada para o produto que descreve, colocando o contribuinte em situação extremamente delicada, visto que exsurge a dúvida de qual NCM a se aplicar, a correta ou a beneficiada.


É de extrema importância a classificação das mercadorias para a facilitação do comércio internacional, portanto, é relevante a compreensão da vinculação entre as classificações da Nomenclatura Comum do Mercosul – NCM e o Sistema Harmonizado - SH.


Note-se que o Sistema Harmonizado foi criado e estruturado pelo Conselho de Cooperação Aduaneira (órgão máximo da Organização Mundial de Aduanas – OMA) sendo observado e adotado pela Nomenclatura Brasileira de Mercadorias (NBM/SH). Ainda, a fim de consolidar o Mercosul os países integrantes passaram a adotar nomenclatura unificada, denominada Nomenclatura Comum do Mercosul – NCM, atualmente adotada pela Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados - TIPI [1].


O questionamento se reforça ao analisarmos os artigo 111 do Código Tributário Nacional que estabelece a interpretação literal da legislação tributária que dispor sobre outorga de isenção, levando ao suposto entendimento de que nos casos em que o benefício ou incentivo fiscal seja o da isenção não caberia interpretação nos casos de erro ou desatualização de NCM.


Entretanto, no que tange ao Imposto sobre a Circulação de Mercadorias e Serviços já há regulamentação que rege os casos de NCM desatualizada, aplicando-se a disposição do CONVÊNIO ICMS 117/96:


"considerando que as alterações procedidas nos códigos da NBM/SH visam aprimorar a classificação das mercadorias;
considerando que os acordos visam atingir as mercadorias enquadradas nos códigos por ocasião da sua celebração; considerando a necessidade de esclarecer o contribuinte, para que corretamente possa cumprir suas obrigações tributárias, resolvem celebrar o seguinte CONVÊNIO. Os Estados (...) firmam entendimento no sentido de que as reclassificações, agrupamentos e desdobramentos de códigos da Nomenclatura Brasileira de Mercadorias/Sistema Harmonizado - NBM/SH não implicam mudanças quanto ao tratamento tributário dispensado pelos Convênios e Protocolos ICM/ICMS em relação às mercadorias e bens classificadas nos referidos códigos."(grifei)



Tal entendimento foi incorporado ao RICMS/SP pelo artigo 606:


Artigo 606 - As reclassificações, agrupamentos e desdobramentos de códigos da Nomenclatura Brasileira de Mercadorias - Sistema Harmonizado - NBM/SH não implicam mudanças no tratamento tributário dispensado pela legislação às mercadorias e bens classificados nos correspondentes códigos (Convênio ICMS-117/96).



Ademais, o Decreto 6.006/96, que aprovou a nova Tabela de Incidência do Imposto sobre Produtos Industrializados - TIPI, dispõe em seu artigo 5°:


Art. 5º Fica a Secretaria da Receita Federal autorizada a adequar a TIPI, sempre que não implicar alteração de alíquota, em decorrência de alterações promovidas na NCM, pela Câmara de Comércio Exterior - CAMEX, ao amparo do disposto no art. 2º, inciso III, alínea "c", do Decreto nº 4.732, de 10 de junho de 2003.


Parágrafo único. Aplica-se ao ato de adequação o disposto no art. 106, inciso I, da Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966, Código Tributário Nacional – CTN.



Assim, por meio deste dispositivo legal verificamos a competência da Receita Federal para adequar a TIPI em decorrência de alterações promovidas pela Câmara de Comércio Exterior – CAMEX, que, por sua vez, possui legitimidade para definir, no âmbito das atividades de exportação e importação, diretrizes e orientações sobre normas e procedimentos sobre nomenclatura de mercadorias (art. 2º, inciso III, alínea "c", do Decreto nº 4.732/03).


Em se tratando a NCM da nomenclatura comum do Mercosul, nada mais natural que o colegiado com mais influência no comércio exterior, o Conselho de Ministros da Câmara de Comércio Exterior, ratifique a publicação das alterações na NCM negociadas com os outros países do Mercosul.


Tais dispositivos visam a garantir os direitos tanto do sujeito ativo quanto do passivo da relação tributária e, principalmente, a segurança jurídica, visto que com o decorrer dos anos a TIPI vem sendo atualizada periodicamente, seguindo as alterações promovidas na NCM, porém o mesmo não ocorre em relação aos Convênios do ICMS que mantêm em alguns dispositivos códigos NCM desatualizados.


Nota-se ainda, conforme o parágrafo único do artigo 5° do Decreto 6.006/06, que as adequações realizadas pela RFB aplicam-se a atos pretéritos, alcançando, portanto, benefícios e incentivos previamente concedidos que continuam aplicáveis mesmo após a alteração do código NCM.


Cumpre ressaltar os casos em que o poder legislativo adota classificação fiscal em desacordo com a descrição da mercadoria à qual se pretendeu conceder incentivos e benefícios, fazendo com que o contribuinte tenha dúvidas quanto à correta classificação a ser adotada. Ou seja, cria situação na qual o contribuinte, a fim de obter benefício, tenha que aplicar determinada NCM incorreta, incorrendo em risco de autuação em decorrência à classificação adotada.


Saliente-se que o órgão máximo e competente em classificações fiscais no Brasil é a DINOM-COANA - vinculada à Secretaria da Receita Federal do Brasil.


Ora, não nos soa razoável situação na qual o contribuinte tenha que adotar errônea classificação a fim de obter benefício tampouco deixar de obter benefício por aplicar a correta classificação fiscal.


Desta forma, verificado que o legislador não é autoridade técnica e competente em classificação fiscal e, ainda, comprovando-se que o erro originou-se em equívoco do enquadramento fiscal [2] no momento da elaboração do instrumento normativo, é possível que se aplique os dispositivos legais supramencionados para que a norma venha surtir os efeitos para a qual foi criada, qual seja, a concessão de benefício ou incentivo fiscal para as mercadorias que especificar.


Portanto, verifica-se que são aplicáveis os regimes tributários previstos em normas anteriores mesmo se estiverem em descompasso com a NCM, quer seja pela falta de atualização quer seja por erro de classificação fiscal pelo legislador.

 

 



[1] Decreto 6.006/06 - Art. 3º A NCM constitui a Nomenclatura Brasileira de Mercadorias baseada no Sistema Harmonizado (NBM/SH) para todos os efeitos previstos no art. 2o do Decreto-Lei no 1.154, de 1o de março de 1971.


[2] Vale frisar que, para se caracterizar o erro na classificação fiscal, é importante a existência de laudo técnico que embase a alegação de equívoco na classificação.

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